Loras,
Antes de mais nada quero deixar bem claro que as colocações que seguem não tem absolutamente nada a ver com as causas do acidente em específico, que pelos relatos pode até tratar-se da conjunção de diversos fatores, ou não.
Minha única intenção é aproveitar suas perguntas para lançar um pouco de reflexão sobre o quesito "modificação versus segurança".
Citação:
Bom, minhas dúvidas::arrow:
- o tranco poderia ter como causa amortecedores de direção insuficientes?
Tanto o amortecedor de eixo quanto o de direção tem a função de atenuar movimentos, só que a atenuação depende da energia contida do movimento.
Fazendo uma analogia: pedaço de isopor entre a mão e um martelo oferece proteção (eficiência) para pequenos impactos, proteção que diminui à medida que aumenta a energia contida nos impactos.
Amortecedor não impede o movimento, apenas atenua, oferece resistência, e esta resistência pode muito bem ser incrementada com uso de amortecedor mais "parrudo" ou amortecedores em paralelo. Isso é muito comum de ser feito nos eixos, mas no sistema de direção pode trazer implicações de dirigibilidade, já que pode afetar o tempo de reação do motorista por causa do volante "mais pesado" ao esterço.
Ou seja, eficiência do amortecedor de direção pode ajudar alguma coisa em caso de pancada lateral no pneu, mas a mesma eficiência que atenua a pancada pode comprometer uma correção rápida de trajetória, e qualquer coisa que altere a dirigibilidade tem que ser feita com muito critério, desde uma simples troca de caixa de direção, elevação da suspensão ou uso de pneus que excedem aos originais, e no quesito dirigibilidade, até a forma de segurar o volante tem influência na segurança.
Citação:
- o carro desceu capotando, ou desceu "em pé"?
Resistência à impactos leva em conta a maior probabilidade de acidente, tanto que a indústria faz testes de impacto frontal e lateral, raramente testes de capotagem, e capotagem pode ser considerado como um risco em potencial pra qualquer jipeiro.
Quem tem jipe "aberto" invariavelmente se sente seguro ao instalar um santo antônio, sensação de segurança que se torna maior com jipe "fechado", seja por adaptação de capota rígida ou mesmo em jipes "fechados de fábrica".
Santo antônio oferece proteção muito questionável, não só pela forma de fixação como também pela limitação de atuação, lembrando que quadro de parabrisa, por mais robusto que seja, não foi feito para suportar o peso do veículo.
Existe capota rígida pra Willys, Engesa, JPX e outros, e sem entrar no mérito da rigidez da capota, a fixação é feita de forma pontual, normalmente por parafusos, onde a soma da resistência dos parafusos (resistência de ancoragem) podem não suportar o peso do veículo em caso de tombo, quem dirá em caso de rolagem.
São poucos os que se preocupam com infiltração de água na união entre carroceria e capota e até isso pode influenciar na segurança, uma vez que infiltração do tipo se mantém por dias seguidos, invariavelmente oxidando os parafusos de fixação, e isso diminui em muito o ponto de ruptura dos mesmos.
Teto rígido de fábrica pode ter lá sua qualidade, mas a segurança pode ser igualmente questionável em caso de capotagem.
Por exemplo, Gurgel X12 com teto de fibra pode sofrer do mesmo mal das capotas adaptadas. Embora a fixação seja feita com boa técnica, com muitos pontos de ancoragem e reforço metálico, não tem a mesma resistência que teria um conjunto único.
Veículos da Land são outro exemplo de "fechado de fábrica" com ressalvas na segurança. Conjunto rígido, sem emendas, mas em alumínio, onde a estrutura pode sofrer sérios danos em caso de capotagem, tanto que pra venda nos EUA a carroceria possui reforço estrutural (quem me passou esta informação foi o Nelson, fundador do JCB, um dos papas do Off Road, ex-dono de "cenzinha" e atual dono de "disco").
Em suma, mesmo em jipe fechado, segurança MÍNIMA contra tombos ou capotagens só com gaiola, e mesmo assim muito bem projetada e muito bem ancorada, e coisa do tipo só se materializa nas mãos de quem tem experiência no assunto.
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- o risco de puxar a Land junto é algo a ser considerado de várias maneiras.
Em termos de segurança, particularmente sempre dou à situação de reboque o nível máximo de preocupação, e isso em qualquer situação, asfalto ou terra, devagar ou rápido, porque tanto quem reboca quanto quem é rebocado sofre influência um do outro, e nenhum dos dois tem liberdade de movimento, pelo contrário, o que existe é um sério comprometimento na dirigibilidade.
Corda, cambão, towbar, três formas de se fazer a mesma coisa, cada qual com suas desvantagens e complicações, mas geralmente quem é rebocado aproveita o momento pra relaxar e aproveitar a paisagem, quando na verdade deveria é ficar mais atento do que quando dirige com as próprias mãos e pernas.
Citação:
Como dimensionamos adequadamente a carga de uma cinta, para que ela seja um "fusível seguro", como no acidente?:?:
Não existe "fusivel" seguro e isso por uma questão muito simples, o que é seguro pra uma situação pode não ser pra outra.
Exemplo, um dos carros desvia de rumo e inicia queda em barranco. Com rompimento da cinta um dos dois fica onde está, sem rompimento os dois podem cair, ou então um dos dois pode ficar preso e segurar o outro. Se quebrar, ajuda ou atrapalha, se não quebrar, ajuda ou atrapalha, entramos no campo do imponderável.
Citação:
O peso do carro reboque... como já discutido várias vezes no fórum. Se fosse um carro mais leve teria descido junto.
Pela lógica e pela prática isso é uma verdade, mas mesmo um carro mais leve pode levar outro mais pesado pro fundo do barranco.
Quantos aqui já não desatolaram jipão pesado com alguns marmanjos aplicando força na lateral do carro? Tudo é uma questão de energia, vetor de aplicação e atrito, ou falta de.
Citação:
- por onde o Gilvan foi ejetado? Janela da porta? Parabrisas?
Aí entra a questão sobre o uso de cinto de segurança.
Sou um dos mais ferrenhos defensores do uso de cinto, mas mesmo assim abro ressalva quando se fala neste assunto de forma genérica, porque, à exemplo do teto rígido, cinto inapropriado pode oferecer a falsa impressão de segurança.
Pra mim, cinto abdominal está fora de cogitação até pro dia-a-dia, cinto abdominal e peitoral, o conhecido três pontos, pra uso no Off Road só se for do tipo fixo, pois o auto-retrátil não oferece proteção adequada em caso de tombo ou capotamento lento, por assim dizer.
Explico: o auto-retrátil tem dois tipos de trava, cujo acionamento depende da desaceleração (trava inercial) ou da inclinação (trava de posição). A trava inercial só tem atuação acima de determinada aceleração/desaceleração, e a de posição acima de determinada inclinação, antes disso o cinto está completamente solto. Mesmo com capotagem, cumprem a função quando o acidente acontece acima de determinada velocidade ou inclinação, desde que naturalmente fixado ao corpo, sem o uso de artifícios pra manter o cinto espaçado, mas se antes do acionamento das travas houver tempo pro afrouxamento do cinto, baubau proteção, e isso pode muito bem acontecer caso o veículo inicie a inclinação de forma relativamente lenta, que é o mais comum de acontecer em trilhas.
Tanto o cinto três pontos auto-retrátil quanto o fixo tem proteção limitada quando se leva em conta o deslocamento lateral do tronco, e isso pra qualquer velocidade, de onde se conclui que segurança efetiva só com cinto de quatro pontos, devidamente fixado e com banco igualmente seguro, porque também não adianta ter cinto seguro com banco "amarrado no arame".
Com isso não estou querendo dizer que todo mundo tem que fazer uso de quatro-pontos, já que dependendo do tipo de "brincadeira" isso pode ir do necessário ao desejável, mas apenas chamar a atenção de que, tão importante quanto o uso, é o conhecimento das limitações dos dispositivos de segurança.
Citação:
- as possíveis lesões citadas pelo Leo (tórax, pelve e crânio) são potencialmente fatais, individualmente.
Pois é, durante uns quinze anos também andei de moto, e ao todo acho que acumulei uns 300~400 mil km, num mix de cidade, muuuuuita estrada, e também muita lama e barranco. Lá pelos idos dos anos setenta a proteção não ia além do capacete, bota, luva e jaqueta de couro, que não dispensava nem quando andava de moto à trabalho, "engravatado" e sob sol. Nos anos oitenta começaram a aparecer alguns equipamentos mais específicos, daí, para o Off Road, nunca mais dispensei a bota reforçada e com biqueira de aço, proteção de joelho, cotovelo, ombros e cinta abdominal. Com todo este paramento mais parecia um ET, inclusive por causa das cores (isso é outro lance que também envolve segurança) e fui motivo de muita gozação, mas do tempo de moto não trago no corpo nenhuma cicatriz, mas tenho na memória a lembrança de vários amigos que morreram por falta de equipamentos de segurança.
Moto e jipe são coisas distintas, e obviamente parachoque de moto é focinho de piloto, mas nosso corpo não faz distinção do meio de transporte. Dependendo do tipo de "brincadeira", mesmo de jipe o uso de capacete é fundamental, e isso independentemente do carro ser aberto ou fechado, de existir gaiola ou não. Uso de outras proteções pessoais também tem razão de ser, dentro de uma lógica de uso é claro, mas seria interessante que todos dessem mais atenção ao uso de cinta abdominal, que tem sua razão de uso até pra quem faz trilha leve, onde o risco potencial de acidente é pequeno mas o risco de lesões em órgãos internos nem tanto, e muitas vezes basta um tranco seco em buraco que as "tripas dão nó".
continua...