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Ford Ranger no reino encantado dos picapes Ele tem lugar definido: é o único a unir decoração, rendimento e resistência
Texto: Roberto Nasser
Fotos: Divulgação


(11-11-09) –
O mercado brasileiro de picapes é peculiar: é o único, no mundo, onde veículo grosseiro em construção, áspero em uso, é visto com distinção social idêntica à de automóvel de luxo. Sub características, porta equipamentos onerosos, pagos, mas que 90% dos usuários nunca utilizará, como a tração nas 4 rodas, a marcha reduzida, a capacidade de carga para 1t e, completando a percepção visual, olfativa, de tato, utiliza motor de ciclo diesel, construído para trabalho duro nunca demandado. São os picapes diesel, cabine dupla, tração nas 4 rodas, veículos caros, com etiqueta de preço rondando os R$ 100 mil, e atingindo 170 km/h de velocidade final.

Não há explicação racional para 90% dos casos de sua aquisição, e a trambolhozidade de seu uso em cidades e estacionamentos, embora muitos a justifiquem pela identificação com a aura do agronegócio – há anos sinônimo de boa renda; ou indução pela violência, para colocar seus usuários acima da linha média da altura dos motoristas, como elevado picape diesel cd e tração, destacado no trânsito, força gentilezas pelos veículos menores, impõe respeito a motoristas mal educados. Nada à toa, a adoção do picape volumoso, alto, comprido, induz a mudança comportamental: quem o dirige troca terno por jeans, camisa Ralph Loren e, preciosistas da imagem, completam-na com chapéu Stetson e canivete de produção artesanal ou, no mínimo, feito em Barretos, SP. Com pequenas variações, é a feição do Macho-Man.

Os pais

Quem criou esta imagem e moda no Brasil foi a dupla Eduardo Souza Ramos e Paulo Ferraz, donos da SR, melhor e mais ativa das transformadoras de simplórios picapes Ford F 1000 em desejadas cabines-duplas. À época, com rodar mais áspero, com motor diesel de projeto original para trator, vendiam-nos a US$ 50 mil – hoje, picape melhor e mais equipado, custa menos. Mas criaram a cultura e vitoriaram trazendo a representação industrial da Mitsubishi para cá. Transformaram carro de pintor e verdureiro em sinônimo de status, através de modificações: maior altura, largas rodas de liga leve, turbo alimentador, decoração externa, itens de conforto de automóvel. Os demais concorrentes os seguiram.

A história dos picapes no Brasil é ASR e DSR – antes e depois da SR.


Ford Ranger

Os picapes Ford são, há décadas, os mais vendidos do mundo. A empresa fez os primeiros, reuniu qualidades. No mercado norte-americano o Ranger é o menor deles. Aqui, no realinhamento de produtos acabou com o F1000, não o transformou em F150. Faz o irmão maior F 250 em São Bernardo do Campo, SP, e o Ranger na Argentina. O daqui é melhor desenvolvido que os norte-americanos.

Em vendas perde para a GM e seu S 10, pobre em construção, motorização antiga, preços menores. E está longe dos picapes luxuosos da Mitsubishi, Toyota, Nissan. Mas o Ranger tem lugar definido: é o único a unir decoração, rendimento e resistência.

Ano passado a Ford melhorou a suspensão traseira, a aderência, a sensação rolante e o conforto. Neste, passou a limpo a estética, como um projeto governamental: mudou tudo – frente, para lamas, portas, laterais, e parece nada ter mudado. Melhorou-o, mas não o atualizou. Porém, parece ter acertado: vendas cresceram 60% e participação de mercado subiu para 12%.

A quem usa, é honesto e coerente com o ganho estético e o casamento de nova grade, faróis, para choques. Laterais e traseira, apenas com mudança das lanternas, adequam-se ao conjunto.

Dentro, bem recebe os usuários dianteiros. Atrás é segunda classe, com pouco espaço às pernas e incômoda posição do banco. Painel agradável aos olhos e ao tato, instrumentos e comandos bem postos e de operação correta.

Não se fale em maciez, ausência de vibrações ou de rumorosidade. Os pneus radiais filtram boa parte das inconveniências, mas há que se lembrar, o dimensionamento é para carregar 3t: 1,8t de seu peso, 1t de carga, motorista. Vazio, reage às irregularidades do solo. Não é um automóvel, e será sempre um picape pela percepção do rolar, das irregularidades do solo, da passagem pelas imperfeições do piso, pela embreagem dura e pela alavanca de marchas precisa, firme, e acionamento quase viril. Em contraposição, para ligar a tração nas quatro, e reduzida, é por botão giratório, coisa boiolo-feminina.

Anda bem. Aliás, muitíssimo bem. O motor MWM/International, quatro cilindros em linha, 3.0 de cilindrada, 16 válvulas, instado, despeja 163 cv de potencia e mais de 38 quilos de torque, plenos em rotação baixa.
Acelera como automóvel de boa estirpe. O elevado torque permitiu à Ford alongar o diferencial e assim, aquela idéia que picape diesel anda em última marcha a partir de 50 km/h, foi-se. Multiplicada a transmissão, o Ranger só recobra a audição com a quinta velocidade acima de 110 km/h, quando volta a ouvir suas ordens para acelerar. E, conseqüência mecânica, faz 170 km/hora e gasta pouco. Tração nas duas rodas, cidade civilizada e estrada, arranha 10 km/litro. Tração nas 4 ligada, é bem definido para ir, seguro para andar no asfalto nestes tempos de chuvas pré-verão. Boa altura livre do solo, bom ângulo frontal de ataque.

Situação

Nada de compará-lo com automóveis. É um picape, coisa filosoficamente tosca, de simplória engenharia, e andar em categoria própria. O interior, interface dos usuários com o veículo, é agradável na formulação, área de contato com os bancos, comandos, confortos cada vez mais tomados aos carros de passageiros, como direção hidráulica, ar condicionado, bom sistema de som, revestimento em couro. Como picape, é do ramo e de quem conhece as agruras do país e, principalmente, tem motor acostumado ao diesel com nafta, que destrói os importados.

Coisas a melhorar ? Há. Acomodação no banco traseiro e o inexplicável o parachoques traseiro com recesso menor que a placa de licenciamento, entronizada por amassamento.

Mas o principal reparo é quanto ao nível de periculosidade inerente à combinação de peso, projeto mecânico e velocidade. A lei é omissa, os clientes querem demonstrar poder e testosterona andando rápido, e os fabricantes atendem. E mais de duas toneladas a 170 km/h, com suspensão traseira com elementos de engenharia centenária, como o eixo rígido e feixe de molas semielípticas, equilibram-se entre a emoção, o pavor e o risco. Não é uma característica do Ranger, nem da Ford, mas situação de todos os picapes deste porte à venda no país. Há que se limitar a velocidade a ponto de equilíbrio com seu dimensionamento mecânico, seja pelas montadoras seja pelo governo.